segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

MP investiga cobrança de taxa extra por aluno autista em escolas do AC

Isadora Rocha, de 38 anos, resolveu não matricular a filha em uma escola devido à cobrança de uma taxa por ela ser autista (Foto: Arquivo Pessoal)Isadora Rocha, de 38 anos, resolveu não matricular a
filha em uma escola devido à cobrança de uma taxa
por ela ser autista (Foto: Arquivo Pessoal)

Escolas estariam cobrando taxa para disponibilizar mediador em sala.
Grupo Família Azul solicitou investigação ao Ministério Público do Acre.

Pais de crianças diagnosticadas com o espectro autista, que integram o grupo de apoio Família Azul, em Rio Branco, relatam que passaram a enfrentar uma dificuldade nova na formação escolar dos filhos. Trata-se de uma taxa extra cobrada por algumas instituições de ensino particulares, nos casos em que a criança necessitar de um mediador para auxiliar na sala de aula. AoG1, a promotora de Defesa do Consumidor do MP-AC, Alessandra Marques, disse que um procedimento será instaurado para discutir a questão junto às escolas, com um prazo definido para o início de 2015.
"Será instaurado um procedimento para poder discutir com as escolas que estão fazendo uma cobrança em separado para os pais de alunos com espectro autista, e fazendo uma cobrança de valor diferenciado dos demais, para prestar os serviços que a lei diz que eles têm que prestar", falou.
O presidente do grupo Família Azul, Arthur Leite, diz que a cobrança vai de encontro à Lei N° 12.764, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, que garante, se for necessário, a presença de um acompanhante especializado.
"A lei é muito clara quando diz que a criança portadora de autismo tem direito ao que se chama de 'acompanhamento especializado', que significa ter alguém na escola que acompanhe a criança nas atividades pedagógicas", explica.
A questão, de acordo com Arthur, é que a própria lei não é totalmente clara ao falar sobre as escolas particulares. Por isso, o grupo decidiu propor ao Ministério Público do Estado do Acre (MP-AC), em reunião ocorrida na terça-feira (9), que entre com uma ação civil pública para apurar se é legal a cobrança de um valor além da mensalidade.
"Procuramos a Promotoria do Consumidor do Ministério Público levando os exemplos que já temos de outros estados e também a regulamentação da lei. Queremos garantir o fornecimento do acompanhamento especializado sem nenhum ônus a mais para os pais. As escolas têm que fazer a inclusão e, a partir do momento que se cobra uma taxa, está fazendo a exclusão do aluno", diz.
'Foi cobrada uma mensalidade e meia, dava mais de R$ 1 mil', diz mãe 
Essa dificuldade foi enfrentada pela arquiteta Isadora Rocha, de 38 anos, que quando procurou uma escola particular para a filha Maria Júlia Rocha, de 5 anos, foi informada que pagaria meia mensalidade a mais, além do valor convencional. "A escola me falou que era a primeira vez que uma criança especial os procurava e ficaram de retornar. Eles me ligaram no mesmo dia e foi cobrada uma mensalidade e meia, dava mais de R$ 1 mil. E eu não coloquei minha filha lá", conta.
Heloneida da Gama, de 37 anos, optou por retirar o filho do colégio particular (Foto: Caio Fulgêncio/G1)Heloneida da Gama, de 37 anos, optou por retirar
o filho do colégio particular
Já a professora Heloneida da Gama, de 37 anos, não precisou pagar nenhuma taxa extra durante os três anos que o filho, João Vitor Gama, de 9 anos, estudou em outra escola particular de Rio Branco. No entanto, em 2015, já era previsto o gasto extra.
Heloneida conta que o problema enfrentado durante o ano letivo de 2014 foi outro. Para ela, o rendimento escolar de João Vitor foi inferior aos anos anteriores, problema que pode ter sido gerado pela falta de capacitação de alguns profissionais em lidar com crianças com autismo.
"No ano passado, fizemos um abaixo assinado para exigir uma sala de AEE [Atendimento Educacional Especializado]. A sala saiu e contrataram um mediador. Só que a escola não contratou um mediador especializado, com qualificação adequada para acompanhar o aluno. E o ano ficou a desejar", reclama.
Por isso, Heloneida decidiu mudar o filho para uma escola do ensino público em 2015. Ela diz não considera inclusão, por exemplo, uma mensalidade diferenciada. "Eu não considero isso inclusão, primeiro, que a mensalidade é diferenciada. E também não há o investimento na qualificação profissional. A gente procura uma escola particular porque acha que tem uma segurança. A gente tem essa ilusão. Então, eu acho que a inclusão não existe", acrescenta.
Glória Medeiros, de 36 anos, é mãe de dois filhos autistas (Foto: Caio Fulgêncio/G1)Glória Medeiros, de 36 anos, é mãe de dois filhos
autistas 
Apesar de não enfrentar problemas semelhantes, a militar Glória Medeiros, de 36 anos, também integrante do grupo Família Azul, defende que todos precisam ter os direitos garantidos. Ela é mãe de duas crianças com autismo. Roberto Medeiros, de 9 anos, estuda no ensino privado, e nunca enfrentou esse tipo de problema, e Roberta Medeiros, de 4 anos, na escola pública.
"Autismo não é de pobre ou de rico. Crianças autistas nascem independente da classe social. Então, nascem autistas que vão para a escola particular e para a pública. Mas independentemente da linha de ensino que vão ter, eles têm que ter os direitos garantidos", defende.
G1 entrou em contato com o Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino Privado do Estado do Acre (Sinepe-AC) e, de acordo com a presidente, Elizabeth Costa, entre as únicas sete escolas sindicalizadas, nenhuma cobra taxa extra pela presença de um mediador em sala de aula. São sindicalizados os colégios Alternativo, Padrão, AME, ABC, Sigma, Vitória e Anglo
"Somos sete sindicalizados. A gente ainda não abrange todas as escolas. Entre os sindicalizados, eu desconheço que seja cobrado algo a mais. O que nós fazemos é pedir que a criança, no turno que não está na escola, faça parceria com outros atendimentos. Mas na questão dos autistas, estamos discutindo, mas ainda está no início", diz

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